terça-feira, 1 de setembro de 2009

I-Juca-Pirama - Gonçalves Dias


Um dos "ritos" de iniciação literária mais marcantes da minha vida foi meu tio recitando pra mim I-Juca-Pirama, em um só fôlego. Era uma noite depois da Feira do Livro de Porto Alegre, num verão dos anos 90. Eu devia ter pouco mais de 10 anos, sei lá. Meu tio carioca tava lá em casa, e tinha comprado a versão da L&PM pocket pra me dar de presente, algo que devia fazer parte da educação literária que ele testava comigo, me dando livros de presente (sou grato até hoje por isso) e conversando sobre eles.

Então, ele começa a recitar, com a voz rouca de fumante carioca, num ritmo compassado, em altos brados. E eu prestando atenção, ao ponto de começar a imaginar tudo. Lembro até hoje da cadência dos versos, muito rítmica e musical; das cenas que imaginei, com cores, cheiros, sons; da crescente tensão narrativa; da sensação de desolação, tristeza e bravura do tupi; daquele mundo estranho e selvagem, que no século XIX se acreditava perdido.

Reli ele muitas vezes, e seu efeito continua muito vivo pra mim. Considero ele um dos meus poemas favoritos, e talvez um dos melhores da poesia em língua portuguesa. A força das imagens, o ritmo muito característico, e a fantástica recriação de um mundo desconhecido, selvagem, aventuresco. E tudo que significa: Coragem perante a morte (a vida humana perante a irredutibilidade da morte, de certa forma) a devoção familiar (e sua complicada natureza), a relação conflituosa entre nossa vida e as tradições e ideais que nos situam no mundo; entre nosso destino (se existem as "terras além dos Andes") e nossa luta contra ele.

Um grande poema sobre coragem, honra, sacrifício, amor; sobre a humanidade, enfim.
Para ser lido em voz alta, como um "canto de morte, guerreiros, ouvi", numa noite verão.

Um comentário:

  1. só um detalhe: em "guerreiros, ouvi" o verbo está no imperativo plural, ouvi vós, e não no indicativo singular pretérito perfeito, eu ouvi.

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